30 de abril de 2013

A casa da esquina


Da casa da esquina que morei
restou apenas a sombra
de uma varanda remendada,
de um terreiro cimentado,
de uma escada quebrada
e de uma parte da cerca de braúna.

A única coisa que ficou intacta
E pra sempre essa imensa saudade da infância.

haicai

o tacho velho de cobre
da minha mãe fazia
doce para o ano todo

29 de abril de 2013

De onde vem...


(trecho do rio Doce perto da represa hidrelétrica em Aimorés (MG)

De onde vem minha poesia?
Já me perguntaram várias vezes.

Vem da imensidão do nada
Bem antes da criação do mundo.

Vem das pedras que meu pai
Colocou no meu caminho
Quando me ensinou a escrever.

Vem das duras palavras da minha mãe
Quando a rebeldia tomava conta de mim.

Vem do boiar dos vaqueiros matutos
Levando a boiada brava para o mato.

Vem do ranger das porteiras velhas
Das estradas de distantes fazendas.

Vem do ar que respiro todos os dias
Não vejo, mas me mantém vivo!

27 de abril de 2013

ainda há em mim

(minha sincera e saudosa homenagem à dona Marta)

ainda há em mim
uma pequena cidade
de terra fértil:
as micas, as pedras preciosas,
a planura, as serras
os rios e os sinos de igreja

ainda há em mim
uma estrada de ferro:
os trilhos, os pontilhões,
as curvas do rio, a distância,
o silêncio e os atrasos

ainda há em mim
um lugar de guardar sonhos
quando a vizinha
contava estórias de príncipes,
de fadas, de assombrações,
de procissões, de jardins,
de manhãs e das damas não recatadas

ainda há em mim
uma luz que nunca se apaga
voo de asas abertas
dos canários amarelos,
cabeça de fogo,
da minha infância
cheia de risos, de anjos
e de pães doces
e tatu
da padaria da dona Marta

25 de abril de 2013

preciso

navegar não é preciso
poetar também não!
mas eu preciso escrever
porque viver sem poesia
é estar no mundo
sem bússula e sem chão

a precisão faz os caminhos
entretanto é a necessidade
que dá forças para a caminhada

viver sem precisão é bom,
sem poesia, não!

22 de abril de 2013

origens


homenagem à minha cidade de Conselheiro Pena

quando nasci
o rio doce não tinha ponte
e a lua não era cheia

os índios Krenak tinham terras
os padres ainda usavam batinas
a igreja mantinha as portas abertas
e os sinos tocavam ao meio-dia

minha mãe, mulher guerreira
sabia receber gentes e parentes
fazia doces cristalizados
cuidava dos filhos como filhos mesmo
e ainda tinha tempo
para ir à manicure fazer as unhas
das mãos e, principalmente, dos pés

quando nasci
a cidade não tinha ruas calçadas
nem cinema e muito menos jardim
só a praça da matriz da igreja católica
a estação velha e o matadouro
o armazém do naninho e o bar do zé preto
o hotel da dona fia e a pensão do alidelmo

quando nasci
as curvas, os buracos
faziam parte das estradas
e do meu cotidiano

haicai

no outono a lua cheia
aparece bem antes
da noite escura chegar

19 de abril de 2013

haicai

o galo velho carijó
canta tão cedo
que acorda até a madrugada

18 de abril de 2013

Nossa casa

(O meu amigo e poeta Luiz Dias, fez-me um grande favor, estou indo para minha terra natal, vou revisitar a casa que nasci e onde passei os melhores momentos da minha vida)


Minha casa não era grande, mas aconchegante, gente indo e vindo.
Minha mãe trabalhava cantando, e como ela gostava de conversar.
O seu jeito de viver nos ensinou tantas formas de amor.
A doçura da sua voz trazia o céu para bem perto da gente.
Tudo era tão simples e doce:
-Deus te acompanhe , meu filho!
-Deus te abençoe!
-Bença, mãe!
-Dorme com Deus, meu filho!
Ela nos contava estórias - sem medos e de amor - algumas, ainda vivem em nossa memória.
Minha mãe melodiou nossa vida, e nos tocou com tanta ternura, que facilmente encontramos o caminho da sensibilidade e da gratidão.
A voz dela nos protegia dos perigos.
Quando a noite tomava o lugar do dia, ela nos cobria de amor.
Nós tínhamos um cobertor, e, em paz, a casa adormecia.
De manhã, o cheiro bom do café passava por debaixo da porta, e nos amanhecia.
Os 'DIAS' floridos passavam calmos.
O 'JARDIM DAS GENTILEZAS' floria na minha casa.


Luiz Dias

15 de abril de 2013

Poesia IV




É no rio doce
Que deságuam
Os meus poemas.

Às suas margens
Vi a lua
Senti saudade
Tive sonhos
Rejeitei amores.

Hoje, muitos anos depois,
Eclode no meu peito
Essa silenciosa saudade.

E é por isso que as palavras
Nunca partem
Fazem parte de mim.

5 de abril de 2013

haicais

as flores roxas
caem quando o vento
balança os galhos

o sabiá-laranjeira
fez o ninho na grade
da janela do banheiro

2 de abril de 2013

antes de nós

para Edinete Henriques Júnior

fonte: http://www.asminasgerais.com.br


a intensidade do silêncio
não interrompe nada
a distância separa os corpos sim!
mas, as almas que são gêmas,
sempre se aproximam;
até mesmo na penumbra do tempo

a eternidade fez questão
de recolher das ruas de nossa cidade,
os resquícios púrpuros e livres
das asas dos nossos sonhos,
das nossas utopias e dos nossos desejos
quando o sino da igreja matriz tocava
todas as manhãs chamando os fiéis

saiba, minha amiga, que nada morre
a vida já era eterna bem antes de nós