29 de dezembro de 2011

Ancestrais


Nasci
Entre as montanhas
Das Gerais
Ando
Em trilhos
De ferro.

Carrego hábitos
Dos meus ancestrais
Que vieram
Do Além-mar.

Enquanto
Sonho todas noites.
Minha mulher
Corta meus cabelos
Na lua nova
Tentando
Desvendar
Meus segredos.

23 de dezembro de 2011

memória

ainda posso ver
pelas janelas antigas
os transeuntes
passando como vultos

ainda posso tocar
com meus braços
o leito do rio doce
e deixar as águas barrentas
lavarem a minha alma

ainda posso abrir
a porta da sala
que nunca foi trancada
apenas encostada
e entrar nas pontas dos pés
para não acordar ninguém

ainda posso pintar
as paredes da casa antiga
mas não posso mudar
o tempo que já passou
porque as melhores memórias
ficaram na minha pele

22 de dezembro de 2011

paciência


aprendi com meu pai
a sentar-me à beira
do rio sem preocupar-me
com o curso da água
apenas com o caniço

20 de dezembro de 2011

recado



volto logo!
fui ali ver o sol
despontar
e ser alcançado
pelo amanhecer

19 de dezembro de 2011

haicai

a arnica montanha
é uma herbácea perene –
a panaceia-das-quedas

platônico


o meu amor pelo mar
já foi mais real.
hoje, é platônico.
as montanhas distanciam
os meus pés das areias
e os meus olhos do azul.

o vento espalha o barulho das ondas
e atiça os meus cabelos brancos
e o meu mais puro desejo.

haicais

as chuvas de verão
chegaram antes do fim
da estação da primavera

na manhã de dezembro
a dona de casa carrega
a sacola cheia de presentes

primeiro a garoa fina
na serra e, depois vem
a chuva farta e constante

17 de dezembro de 2011

oficio















"Girassóis" de Van Gogh

o poeta
pensa que domina
as palavras
como um corcel
correndo livre pela campina

o pintor
mistura as tintas
com maestria e sutileza
acreditando que dará asas ao pincel

nas entrelinhas e nas cores
há a alma de quem escreve
e de quem pinta.

15 de dezembro de 2011

Credo

ao meu amigo Kal (Carlos Alberto de Lima)

a minha intenção
era apenas colher
um sorriso sobre o tempo,
lágrimas não.

cada dia já tem
o seu próprio fardo
gostaria abraçar-te, meu amigo,
mas não posso,
a distância não nos separou
apenas nos deixou de mãos vazias
o nosso credo não estava em sinagoga
nem em gestos humanos.

13 de dezembro de 2011

haicais

as chuvas de ontem
agitaram as folhas
das árvores da quadra

o telhado do prédio
não suportou as chuvas
da tarde de ontem

a enchente carregou
até os carros parados
nas ruas do bairro

12 de dezembro de 2011

A travessia

O rio
Da minha cidade
Era como a extensão
Dos meus braços

Perto da estação velha
Descia pelo beco
Dos armazéns do Carlomanho
Que ia dar nas pedras do canalão

Debaixo da ponte
Atravessava o rio a nado
Até alcançar a prainha dos Abelhas
E ganhava o mundo

9 de dezembro de 2011

haicais

a cotovia cinzenta
à noite dorme no galho
e durante o dia afia o bico.

se a sua pele macia
não roça na minha,
sou peixe fora d’água.

os quitutes da minha vó
eram feitos na gordura
e na fornalha de barro.

5 de dezembro de 2011

Pequenas coisas

Tudo passa
Todos vão embora
Permanecem apenas
As pequenas coisas.
A minha saudade
E as minhas lembranças:
A igreja católica
E a praça da matriz.
A igreja presbiteriana
E o alto-falante.
A pensão do Alidelmo
E o bar do Zé Preto.

2 de dezembro de 2011

haicais

a chuva da tarde
deixou a terra molhada
e os pássaros arredios

os ventos fortes
trouxeram as chuvas
antes da estação propícia

a janela ficou aberta -
a tempestade da tarde
inundou toda a varanda

1 de dezembro de 2011

Ninguém se afasta


O tempo não faz
A distância.
É a nossa mente
que mente
para as nossas lembranças.

Ninguém se afasta
de si mesmo.

Não adianta
atravessar ruas
correr estradas
navegar mares
as lembranças
vencem sempre.
Porque elas
estão dentro
de nós mesmos.