Nasci
Entre as montanhas
Das Gerais
Ando
Em trilhos
De ferro.
Carrego hábitos
Dos meus ancestrais
Que vieram
Do Além-mar.
Enquanto
Sonho todas noites.
Minha mulher
Corta meus cabelos
Na lua nova
Tentando
Desvendar
Meus segredos.
Viver é fácil. Conviver que é difícil.
Nasci
ainda posso ver
pelas janelas antigas
os transeuntes
passando como vultos
ainda posso tocar
com meus braços
o leito do rio doce
e deixar as águas barrentas
lavarem a minha alma
ainda posso abrir
a porta da sala
que nunca foi trancada
apenas encostada
e entrar nas pontas dos pés
para não acordar ninguém
ainda posso pintar
as paredes da casa antiga
mas não posso mudar
o tempo que já passou
porque as melhores memórias
ficaram na minha pele
"Girassóis" de Van Gogh
o poeta
pensa que domina
as palavras
como um corcel
correndo livre pela campina
O rio
Da minha cidade
Era como a extensão
Dos meus braços
Perto da estação velha
Descia pelo beco
Dos armazéns do Carlomanho
Que ia dar nas pedras do canalão
Debaixo da ponte
Atravessava o rio a nado
Até alcançar a prainha dos Abelhas
E ganhava o mundo
Tudo passa
Todos vão embora
Permanecem apenas
As pequenas coisas.
A minha saudade
E as minhas lembranças:
A igreja católica
E a praça da matriz.
A igreja presbiteriana
E o alto-falante.
A pensão do Alidelmo
E o bar do Zé Preto.