30 de março de 2011

A criação e o amor


Há muito tempo
Escrevo sobre o amor.
O amor de tempo passado,
de tempo presente
E de tempo futuro (não existe).

O amor foi feito em seis dias
Assim está escrito no Gênesis
E no sétimo dia, o Criador foi descansar.

Como sou poeta e não criador
Dedico todos os dias
da minha vida ao amor.

O amor é igual ao leite
Que transborda da panela
Quando se descuida, derrama.
É preciso muito cuidado e atenção.

Até os amores tardios
precisam de carícias suaves,
de beijos molhados
e de perfumes silvestres.

Só Deus não precisa
cuidar do amor
porque Ele é o próprio amor.

A vida não me ensinou nada


















A vida não me ensinou nada
Fiquei muito tempo acendendo
Cigarros baratos e sem filtro
Quando poderia estar gozando a vida.

A vida não me ensinou nada
Fiquei aprendendo fórmulas químicas
Cheias de contas com números primos
Quando poderia estar tomando banho no rio.

A vida não me ensinou nada
Perdi muito tempo lavando pratos
Guardando rancores e extirpando amores
Quando o melhor seria cuidar de jardins.

sem titulo

O meu amigo Luiz Antônio Dias me enviou este lindo poema.

A vida sem sonho,
Fica sem gosto
E o desgosto toma conta da gente.

O sonho perfuma a vida
E encanta os nossos dias.

Luiz Dias

Silenciosamente


Quando o sol desponta
Mais um dia de saudade
Amanhece em mim.

Tudo me dá saudade.
Até as coisas que não vivi.

A cidade, a rua,
O rio doce, a casa amarela,
O apito do trem e a ponte de ferro.

Silenciosamente a saudade
Adormece a minha noite.

29 de março de 2011

haicais
















o barco ao mar
só precisa de ventos fortes
para chegar ao seu destino.











a chuva em dezembro
anima o sertanejo a arar
a terra seca do sertão.










os pardais se banham
no fim da tarde
de um dia muito quente.

8 de março de 2011

Tardes vazias












Roberto Duarte (in memorium)

Há dias em que as tardes
Ficam tão vazias e tristes
Que parecem noites sem sombra
E sem lua.

Há horas em que os relógios
Não marcam nem apontam nada
Porque tudo mais é monótono
E sem luz.

Aquela rua calçada de pedras
É apenas uma saudade inominável
As grades da casa ainda estão lá
Mas o sorriso e a receptividade
Não mora mais naquele endereço
Agora é um corpo imaterial
E só o vento leve consegue sustentar
A alma de um eterno aprendiz
Aqui na terra e lá no céu.

7 de março de 2011

haicais

do alpendre do casarão
ouço a roda d’água
prometendo fubá novo


as rolinhas de galho em galho
passam o dia todo
aguardando farelo de milho


a chuva no carnaval
atrapalhou a alegoria
e a fantasia dos foliões

Jardins no deserto

o meu ofício
é árduo demais.

descortinar
os mundos encobertos;
cuidar
de jardins no deserto;
captar
os recados perdidos
das almas humanas
e ainda dormir
todas as noites
um sono profundo.

Lavrador

"O lavrador de café", obra do pintor Cândido Portinari

Eu sei que sou pouco lido
Mas a poesia é a minha lida.
Nasci no mato, na roça
Minha lavoura é a palavra
Não me importa se é pouco lida.

Mas levanto todos os dias bem cedo
Antes de o sol aparecer no horizonte.
Antes de a água límpida deixar a fonte.
E colho as palavras e os versos
Que ficaram nas frestas ou no teto.

Antes que o mundo acorde
E apague com o vento forte
A brasa incandescente do poema
Que ficou guardado no meu peito.

6 de março de 2011

“Gracias”

à memória de Haydé Mercedes Sosa
Já tive muito mais esperança
Ao pé dos Andes sob o sol latino
Quando os homens queriam fazer
A sua história com as próprias mãos.

Quando a voz do povo não era ouvida
Mas os ventos andinos traziam vozes
Dizendo que isso um dia vai acabar
Porque a história não termina nos cárceres
Nem em valas comuns e rasas.

Quando a tempestade invadia o céu
E o tempo fechava em nuvens escuras
Aparecia atrás das cordilheiras
O sol, a luz e claridade dos acordes
Suaves e doces dos charangos.

Quando apareceu na terra do fogo
Um pássaro cantante recolhendo
Todos os ossos e todas as dores
Da sua gente sofrida e oprimida.

“Gracias a la vida” dou todos os dias
Por ter ouvido Mercedes Sosa
Cantar toda sorte de sua gente
E que a morte não me encontre
Solitário, triste e indiferente
Aos sonhos libertários.

4 de março de 2011

Ah, se eu...

Ah, se eu pudesse dizer
Aos homens que são os sonhos
Que nos fazem chegar mais longe.

Ah, se eu pudesse...

Ah, se eu pudesse dizer
Aos homens que a calma
Não tem nada haver com a força
Nem com a fraqueza
É apenas uma qualidade da alma.

Ah, se eu pudesse...

Ah, se eu pudesse dizer
Aos homens que ser grande
Não é tão necessário
Quanto ser integro e inteiro.
O rio quer apenas chegar no mar.

Ah, se eu pudesse...
Ah, se eu pudesse...

A vela

A solidão sempre vem
não adianta esconder
o sol com a peneira.


A vela acesa, um dia, apaga.
A solidão, não!

2 de março de 2011

Monet

Quero voltar a ouvir
O canto do melro
Na beira da estrada.
Quero sentir a brisa
No rosto
Como as crianças
Pintadas por Monet.
E lentamente, acordar
Em plena primavera.

1 de março de 2011

haicais



















o pirilampo pousa
na flor com tanta delicadeza
que parece uma jóia rara.

















ao cair da tarde
a breve dança das sombras
anuncia a despedida do dia.


















até quando a primavera
resistirá aos trovões e nuvens
das intensas chuvas de verão!