29 de setembro de 2009

Colher o bem

In memorium ao meu tio e padrinho Sebastião Silveira


Não posso deixar de falar
Que a poesia não me vale nada
Quando as nuvens do céu ficam escuras.
E não adianta espalhar
Versos rimados pelo chão
Encher os braços de sonhos
Nem lembrar das frescas manhãs.

A morte, às vezes, nos deixa de mãos vazias
Para refazer as cores das manhãs seguintes.

No mês em que as flores renascem
Subi as ladeiras do parque de uma colina
Que mais parecia uma montanha sem-fim
Para jogar flores sobre terras escavadas.
E despedir de um homem que soube
Sair, plantar e colher o bem a vida toda.

28 de setembro de 2009

Haicais


O vento na janela
balança a cortina
do quarto do casal


O gato preguiçosamente
deitado na poltrona
só espia a mesa da sala

O barulho ensurdecedor
das cigarras na árvore
anuncia o fim de um ciclo

24 de setembro de 2009

Haicais

sonhos imperfeitos
a beleza encoberta
um eu nebuloso
Marjorie Veríssimo

esperar o sol a chuva
na natureza a vida
esperança do melhor

Marjorie Veríssimo

22 de setembro de 2009

Ainda exala


A minha vida começa
em uma rua de terra
e quando chovia
dobrava barquinhos de papel
para descer a enxurrada
até afundar no rio.

A minha infância se confunde
Com as histórias de fadas
Contadas magistralmente
Pela vizinha casada com um açougueiro.

A minha história espreita
Com os sons do sino da igreja
Chamando os fiéis para rezar
E levar seus mortos para o cemitério.

A minha vida ainda exala
Os cheiros de goiaba madura
E as cantorias em noite de lua cheia.

18 de setembro de 2009

Haicais


O vento que sopra
Estremece e carrega
Muitos pensamentos

Marjorie Veríssimo


O nunca é sim
O que parece claro
Não se pode ver


Marjorie Veríssimo

14 de setembro de 2009

Haicais

os amantes ardentes
sabem colher lírios
no brilho da lua


os melhores amores
são como vinho
um bálsamo para alma

o fogo que queima
a floresta amazônica
é o mesmo que faz comida

10 de setembro de 2009

A fragilidade do amor


Mais frágil
Que o amor
Só a tarde
Solitária
Esperando
A escuridão da noite.

Mais frágil
Que o amor
Só o ninho de pássaro
Vazio e abandonado
Na árvore morta.

Mais frágil
Que o amor
Só o regato
De águas límpidas e silentes
Descendo a encosta.


Mais frágil
Que o amor
Só as lágrimas
De uma criança abandonada.

9 de setembro de 2009

Memória

O pescador quando
lança a rede ao mar
não sabe de nada.
Mas acredita
que sob as águas
há fartura de peixes.

Quem pesca
não pode ter memória.

Assim como quem ama
não pode esquecer
cada instante passado
com sua amada.

8 de setembro de 2009

O mar sem Minas


O mar fica
Muito longe de Minas,
Mas o vento
Que agita suas marés
Vem das alturas das montanhas.

O mar é muito profundo,
Mas o rio que leva as águas
Nasce nas encostas desses morros.

É por isso que Minas
Não precisa de mar.

4 de setembro de 2009

Haicais




3 de setembro de 2009

Mercado Central

Homenagem ao Mercado Central de Belo Horizonte
pelos 80 anos de existência



Quantas manhãs
o mercado viu chegar
nesses últimos anos?

Quantas flores
saíram dos seus corredores
para as festas e as casas?

Quantas iguarias
foram vendidas
em suas mercearias?

Quantas vezes as portas
Se abriram e se fecharam
Em todos esses anos?

Vidas se cruzaram.
Amores começaram.
Alegrias terminaram.

A cidade cresceu
e se modernizou ao redor
do mercado que sempre
foi o mesmo lugar
de encontros e desencontros.

O mercado central é tato,
é som, é olfato e é sabor
que se entrelaçam
pelos corredores
do prédio antigo
e que renova a cada dia
a vida e o sentido da cidade.

Haicais



2 de setembro de 2009

O despertar



a casa que eu sempre regresso
não pode ser comprada
nem vendida.

quando a deixei
queria correr o mundo
atravessar os mares
sentir outros ares.

se eu ainda tivesse tempo
regressaria para a casa
que me viu nascer.
e todas manhãs iria me banhar
no rio que atravessa a cidade
e nunca deixaria o meu coração
despertar desse lindo sonho.

se eu ainda tivesse tempo
iria cuidar do jardim
todas tardes ensolaradas
e descansar o resto do dia.

Amor e paixão

as minhas "relações cordiais" com a poesia da acadêmica e
mestra Sônia Queiroz



o amor se afoga
quando tiramos
a paixão do coração

porque o amor
não é chama
que lentamente
consome e sufoca
a nossa alma

mas um rio que corre
brando para o mar
entre remansos de tolerância
e corredeiras de tédio


amor é destino,
paixão, circunstâncias,
lampejo e desejo apenas.

1 de setembro de 2009

A dois


Ninguém precisa
Aprender a ser só.
Isso é coisa de quem
Não tem nada pra dizer.

Olha o céu
Não tem só uma estrela
São muitas outras
Uma na companhia
Da outra.

Olha a lua
Tem várias luas
Lua cheia e lua nova
Lua crescente e lua minguante
E todas brilham
Umas brilham mais outras menos
Mas brilham.

Ninguém precisa
Aprender a ser só
Nem o primeiro homem
Que podia ser o do mundo todo
Não quis ficar só.

A vida só vale a pena
Ser vivida de verdade
E só se for, no mínimo, a dois.

Ninguém nasceu pra ser só.